Muito tempo atrás éramos nômades. A cada quatro invernos saiam os guerreiros para procurar o novo lugar para morar. Quando a caça se fazia difícil o grande conselho se reunia e dizia: “Daqui a quatro Luas vamos sair daqui”.

Então nesse período eles arrancavam mandioca e guardavam sua farinha, tiravam o milho e armazenavam alguns grãos, guardavam feijão e vários tipos de sementes preparando-se para a viagem.

Na Quarta Lua se fazia um ritual, onde no final os índios pegavam seus pertences: potes, sementes… e desciam para o rio, colocavam tudo nas canoas e partiam. Os guerreiros que tinham achado o novo lugar iam na frente mostrando o caminho, no centro iam os idosos e as crianças rodeados de outros guerreiros.

Assim foi acontecendo geração após geração até chegar aqui em Porto Real do Colégio (Alagoas). Foi em 1578 que eles desceram e rapidamente retornaram e disseram para o conselho: “Não podemos mais subir nem descer porque a ‘civilizaçãoÂ’ vem aí arrasando com tudo, então vamos ficar aqui mesmo”.

Um tempo depois chegaram os Bandeirantes e os Jesuitas. Eles queriam nos catequizar e nós guerreamos muito. Muitos foram massacrados e os sobreviventes Kariris foram aldeados ao redor de uma capela.

Depois, muitos sobreviventes de outras tribos foram chegando: Karapotô, Akonã… e logo em seguida vieram os Xocó e os Nantu e mais tarde os Xucuru e os Pancararu, assim se formava em COLÉGIO uma multicultura que passou a denominar-se KARIRI-XOCÓ.

Os brancos nos obrigaram a lutar contra os negros nos QUILOMBOS nos últimos anos do século XVII. Daí nosso povo começou a se misturar com negros e com europeus.

Fomos muito usados pelos brancos para acabar rebeliões. Inclusive, nos fizeram lutar contra outras tribos. Lutamos na guerra contra Holanda (1630), contra a Argentina (1825), contra Paraguai (1865).

Por exemplo, o meu avô só porque não quis vender a sua colheita de roça para o superintendente foi colocado na lista para ir na Primeira Guerra Mundial e meu tio chegou a participar da Segunda Guerra Mundial.

Nós índios KARIRI-XOCÓ também participamos da Independência do Brasil, e de todas as fases da história deste país.

Fomos chamados de Índios até 1798, quando foi fundada a Diretoria dos Índios, começando assim os critérios de discriminação. Passaram a nos chamar de Caboclos. Os Jesuítas tinham nos obrigado a morar ao redor da Igreja, mas os colonizadores chegando diziam: “Índios saiam daqui, quem vai morar aqui é a classe alta”. Afastaram-nos da Missão e nos reduziram a morar numa rua estreita.

Em 1873, foram declaradas extintas todas as aldeias de Alagoas – Foram Extintas as Terras mas não os Índios. Não tinha mais aldeia. Morávamos numa rua. Desde Julho de 1876 a rua foi chamada de Rua dos Caboclos até 1944 quando passou a se chamar Rua dos Índios até 1978, ano em que saímos da rua e recuperamos parte de nossas terras. Ocupamos à força a Fazenda Modelo, hoje conhecida como Sementeira. A rua hoje leva o nome de São Vicente.

Então deste processo político, histórico e social temos em Kariri-Xocó uma nova etnia, uma tribo de pessoas que resistem, de guerreiros adaptados que sabem preservar sua sabedoria e também trocar com outras sabedorias.