Eu sou índio porque nasci índio e não porque existe Funai.

O índio nasceu da Natureza, faz parte da Natureza, ele sabe como conviver com a Natureza. Quando morre um pouco dela morre um pouco do índio também. Antes nós tínhamos tudo, éramos fortes, mas hoje com a devastação e com a discriminação estamos morrendo. Eu vejo a Natureza como algo superior. A gente acredita em Deus através da Natureza e nós temos que cuidar bem dessa obra divina, bonita. Eu faço tudo para que a Natureza possa recuperar coisas que perdeu.

Eu me sinto humilhado porque ainda hoje, 500 anos depois de roubarem nossas terras, temos que lutar por elas. Nós não escondemos nossa identidade, somos índios. Ainda resta nossa religião, não tudo, porque os brancos fizeram um massacre grande, matando, perseguindo, estuprando…

O retrato da violência esta no rosto de cada um, aqui no Nordeste; está no Cruzeiro, ele é o símbolo da perseguição portuguesa, do massacre. Sem esquecer o que aconteceu, espero mudar nossa realidade. É difícil porque moramos num país onde quem fala mais alto é o dinheiro, mas a gente não vai desistir. Há quatro anos que estamos lutando pelo reconhecimento de nossa aldeia. Eu tenho sempre viajado a reuniões, enviando documentos, conseguimos que a FUNAI mandasse um antropólogo para fazer um estudo, estamos esperando o reconhecimento. É uma humilhação ter que vir um branco de fora para dizer se a gente é índio, porque nossa identificação esta na nossa cultura, nós que temos que dizer que somos índios e não eles. Hoje a lei manda um antropólogo para levar uma prova se tem ou não índios, até mesmo os antropólogos que vieram por aqui não concordavam com isso. Esperamos que depois do reconhecimento, demarquem a terra para trabalharmos tranquilos, para poder preservar mais nossas matas e o rio também.

Índio é aquele filho de índio que preserva sua cultura, sua religião, que aprende com seus antepassados e continua a ensinar para as futuras gerações. Eu sou índio porque nasci índio, e não porque existe FUNAI. Há 100 anos atrás não existia FUNAI e meu tataravô existia.

Temos muitas coisas para ensinar ao mundo lá fora…. respeitar e conviver com a Natureza. Tem coisas da Natureza que a gente não pode falar para o branco, mas tem coisas que estamos passando porque é muito importante sua preservação, porque todos dependemos dela, porque a Natureza morrendo nós morremos também. Queremos preservar as matas, resgatar os remédios nativos, naturais. É necessário ensinar isso dentro da escola. A gente não espera pelo governo, queremos fazer mutirões para replantar a mata… queremos cuidar desse rio. Muitos índios querem colaborar e colaboram, quem nega alguma coisa à Natureza está negando a si próprio.

O mundo precisa de muita humanidade. Contribuir uns com os outros pela vida, olhar mais para quem está precisando, parar com a violência. Eu quero um mundo melhor, sem preconceitos, onde seja respeitado o direito de cada um. Quero que o governo respeite os índios, e que na suas terras sejam os mesmos índios quem decide o que se faz. Espero que termine essa política de exploração e perseguição dentro das terras indígenas.