DOCUMENTO FINAL DO SEMINÁRIO PATAXÓ HÃHÃHÃE: DISCUTINDO O PRESENTE PARA PROJETAR O NOSSO FUTURO.

Aldeia Caramuru, 24 de setembro de 2004.

Durante os dias 22 a 24 de setembro de 2004, estivemos reunidos, cerca de 400 pessoas, em um seminário, onde tivemos o prazer de contar com os parentes Tupinambá, e representantes de diversas entidades amigas e parceiras de nossas lutas, tais como a Coordenação do Cimi Regional Leste e toda a equipe de Itabuna; ANAÍ-BA, Pastoral da Criança da Diocese de Itabuna, a FASE- Itabuna, APOINME – Articulação dos Povos Indígenas Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo, a Escola Agrícola Comunitária Margarida Alves de Ilhéus e a Thydêwá. Todos ajudaram muito nas nossas discussões.

O nosso seminário foi marcado pela presença maciça da comunidade e uma enorme vontade de encontrar soluções para os problemas que enfrentamos no nosso dia a dia, tendo como objetivo maior discutir em formas de oficinas as várias políticas públicas e governamentais que atingem o nosso povo e os parentes presentes no seminário. Queremos construir ações e atividades que tragam melhorias concretas de forma total para toda a comunidade.

Neste sentido apresentamos a sociedade brasileira os resultados que acreditamos ser de fundamental importância para a garantia dos direitos e da construção da cidadania dos nossos povos.

Diante da conjuntura que avaliamos no seminário, de total inércia e falta de clareza de uma política indigenista por parte do governo Lula, traduzida esta falta de clareza e um avanço sistemático e violento dos inimigos dos povos indígenas (fazendeiros, madeireiros, banqueiros, políticos, etc), propostas como a da demarcação de nossas terras ficarem a critério do Congresso Nacional muito nos preocupa e nos convoca a nos encontram-nos cada vez mais e juntarmos forças de todos os cantos do Brasil, de todos os povos e somar com a dos nossos aliados para enfrentarmos este enorme perigo que ronda as nossas aldeias. Se já não bastasse a enorme violência que tem se cometida contra os nossos povos, as invasões de nossos territórios, os assassinatos sistemáticos de nossas lideranças, a esterilização de nossas mulheres, o desrespeitos aos nossos direitos históricos e até os constitucionais, temos agora mais este ataque contra nós.

Durante as oficinas (Terra/Saúde/Educação/Produção) nos debruçamos e muito discutimos sobre estes desafios externos e as nossas dificuldades internas, vendo não só os nossos direitos, mas também os deveres que cabe a todos nós. Encontramos muitas deficiências que precisam ser urgentemente superadas e que dependem unicamente da nossa vontade, da nossa união, do nosso processo organizativo e de um processo de participação que envolva desde as lideranças maiores (nossos caciques), grupos organizados, associação, professores, pais, velhos, mulheres, jovens, enfim uma participação de toda comunidade com um único sentido, somar forças para o enfrentamento do nosso inimigo maior, que querem a todo custo continuar nos oprimindo, e em especial tomar da gente aquilo que é mais sagrado para todos nós: A nossa Terra.

Durante as oficinas discutimos e encaminhamos as seguintes propostas :
TERRA:

1. De imediato, a contratação de advogados, pela comunidade, para atuar nas questões de processos ligados a questão da terra;

2. A comunidade decidiu que os caciques devem trabalhar em coletividade nas questões da comunidade, sobretudo nas atividade da terra promovendo a união de todos;

3. A comissão da terra terá autonomia junto aos caciques, lideranças e membros da comunidade, associação, organizações e Ongs, de se reunir para discutir, encaminhar os problemas relacionados a terra;

4. Que a comunidade tenha compromisso e responsabilidade para ajudar na luta da terra com a participação efetiva de todos:
* Fiscalizar as localidades;
* Ajudar financeiramente as lideranças nas viagens;
* Que cada líder local tenham compromisso de incentivar e conscientizar seus parentes em contribuir financeiramente nas atividades que envolve as questões da terra; e
* O representante deverá prestar contas dos recursos financeiros arrecadados para os fins citados acima.

5. Que haja um meio de comunicação entre as aldeias para melhor relacionamento entre as comunidades;

6. Que haja articulação com os parentes do sul, extremo sul e baixo sul da Bahia para o desenvolvimento de ações que visem a conquista e a garantia de nossos territórios.

7. Apoiar a luta dos parentes Tupinambá de Olivença na identificação do seu território;

8. Reunião dia 30 de setembro de 2004, com a comissão de terra, caciques, e pessoas da comunidade que estejam interessados nos encaminhamentos sobre a problemática terras.

PRODUÇÃO:

1. Fazer uma reunião com associação junto a comissão de agricultura e grupos de trabalhos para a melhoria da agricultura na aldeia e suas praticas;

2. Que cada localidade organizada devera criar seu próprio banco de sementes;

3. Que a comunidade junto a comissão de agricultura procura as autoridades competentes para tomar as devidas providencias em relação aos alugueis de pastos, extração de madeira, palmitos, etc;

4. Buscar orientações técnicas no âmbito das necessidades agrícolas;

5. Que a comissão promova reunião a cada trimestre;

6. Que a comissão de agricultura discuta e promova meios de escoamento, comercialização e beneficiamento dos produtos das comunidades;

7. Que cada região desenvolva seus trabalhos coletivos. Potencializando a riquezas existentes nas localidades.

8. A Associação estabelecer um calendário de reuniões com os seus associados para discutir e encaminhar problemas referentes a produção das áreas;

9. Realização de um encontro no dia 24 de outubro de 2004, com a participação da Comissão de Agricultura, Associação, Caciques, Grupos Organizados para encaminhar as questões da produção nas áreas.

SAÚDE:

1. Denunciar a situação de descaso promovido pela má atuação da Funasa junto às comunidades;

2. Mobilizar e organizar a comunidade para maior na valorização da medicina tradicional e os seus troncos velhos;

3. Buscar formas conjuntas de denunciar, fiscalizar e definir ações de saneamento e melhorias no sistema de abastecimento de água nas aldeias;

4. Estabelecer parcerias com entidades que trabalhem a questão da medicina natural e com os apicultores da aldeia;

5. Realização de encontros para conscientizar a comunidade em especial os jovens sobre doenças sexualmente transmissíveis e outros questões ligadas a saúde;

6. Que a FUNASA participe e colabore com os encontros de estudos feitos pelo grupo de mulheres e de medicina da aldeia;

7. Inserir as mulheres nos espaços de definição e aplicação da política de saúde indígena para as aldeias, tais como: Agentes de saúde, Representação nos conselhos local, distrital de saúde e outros.

8. Realização de reuniões periódicas da FUNASA equipe de saúde e comunidades nas varias regiões.

9. Realização de um seminário de dois dias (14 e 15 de novembro de 2004) para planejar e encaminhar todas estas propostas acima citadas.

EDUCAÇÃO.

1. Organização e fortalecimento da Associação de Professores indígenas do sul, extremo sul e baixo sul da Bahia;

2. Potencializar a utilização dos meios de comunicação existentes nas aldeias, tais como Internet, Rádio Comunitária e outros;

3. Buscar meios e ações que visem a integração Escola x Comunidade x Escola;

4. Criar ações que visem a conscientização do alunado quanto a utilização do colégio, meio de transporte e outros de formas responsável e coletiva;

5. Uma maior participação do colégio na luta pela terra.

6. Criação de um regimento interno para o colégio feito pelo colegiado com a aprovação da comunidade;

7. Realização de um encontro para discutir e encaminhar as questões levantadas no seminário.

A realização do seminário, foi um importante momento para o povo Pataxó Hãhãhãe, rico em discussão, partilhas, mas sobretudo por apontar soluções para os diversos problemas que existem nas nossas comunidades.

Este desejo antigo finalmente foi realizado de forma participativa, contando com ajuda dos parentes Tupinambá de Olivença há quem muito agradecemos e a todas as Entidades que ajudaram de forma direta e indireta para que este sonho se concretizasse. Infelizmente a FUNAI, FUNASA e Secretaria de Educação não corresponderam as nossas expectativas, aparecendo apenas no final do encontro os representantes da FUNAI e Secretaria de Educação e que não puderam contribuir muito com as nossas discussões. Entretanto, isto não prejudicou de maneira alguma os nossos trabalhos. Na verdade acreditamos que todas as propostas apresentadas dependerão muito mais da nossa organização, união, respeito as nossas tradições para assim finalmente conquistaremos a nossa TERRA SEM MALES.

Povo Pataxó Hãhãhãe.