Mariana Monteiro (jornalista de Telelistas) entrevistou a YAKUY
sobre o projeto Índios On-Line

Yakuy Tupinambá:

Participei da primeira edição de Índios On-line, sou da Aldeia Indígena Tupinambá de Olivença – Ilhéus – Bahia. Tenho 46 anos, sou Técnica em Economia Doméstica, hoje estou residindo em Salvador, devido a necessidade de adquirir conhecimentos para melhor ajudar meu POVO. Estou fazendo cursinho pré-vestibular, pois estou pleiteando uma vaga no curso de Direito da UFBA. Sou militante do Movimento Indígena.

MM – A oportunidade de estar conectado ao mundo é uma garantia de acesso a que informações? Que informações interessam para a sua comunidade?

YAkuy: A um conjunto de novos significados, onde novas realidades são construídas, sem que isso implique abandono das nossas tradições. Toda sociedade se move, se expande, enquanto a nossa tem que permanecer fixa imutável, para atender a necessidade de uma saudade da tradição? Tradições são sistemas intelectuais dinâmicos e capazes de mudar. Nossos dinamismos culturais continuam sendo desconhecidos, na medida em que nossas vozes continuam sendo caladas, cobertas pelas vozes do que se julgam especialistas. Conectar-se ao mundo através da internet é ter direito a ter um rosto e mostrar nossa voz. É saber dos acontecimentos e, interesses que envolvem toda humanidade. Fazemos parte desse contexto.

MM – Que conhecimento é de interesse das comunidades indígenas envolvidas no projeto?

YAkuy: Acesso a informação, a garantia dos direitos , para mudanças no quadro de exclusão social, promover o desenvolvimento e a construção de políticas inclusivas. Utilizar o virtual para habitar ainda melhor o território, para tornar-se cidadão por inteiro.

MM- Existe muita troca de conhecimento da cultura de cada comunidade?

YAkuy: São 230 etnias indígenas reconhecidas oficialmente, e mais de 180 línguas faladas, no território brasileiro, cada etnia possui diferenças que lhe são peculiares em relação a cultura e tradição. A troca de informações via correio eletrônico, via chat, possibilita-nos um intercambio cultural. Nosso objetivo é a expansão desse projeto em todas as aldeias indígenas existentes.

MM- O acesso à grande rede ampliou a atuação de vocês no mundo? Vocês se sentem mais presentes, mais representados estando na internet? O que mudou na vida de vocês?

YAkuy: Com certeza sim. O acesso a comunicação virtual nos possibilitou a inclusão digital, hoje nos sentimos menos isolados, podemos passar em tempo real as informações necessárias para a construção da nossa Cidadania Plena. Diminuímos a intervenção de contradições criadas em relação a nossa cultura, podemos mostrar ao mundo nossos anseios.

MM – Retirei de uma carta do Sebastian um trecho e gostaria que vocês falassem um pouco sobre isso: “Os índios de hoje, após de 500 anos de milhares de formas diferentes de opressão, continuam a viver, a acreditar na liberdade, na solidariedade, na união… Continuam a dançar, a cantar e a lutar por essa vida melhor para todos.”

Yakuy: Talvez, ou infelizmente, somos entre os humanos, os que ainda não perderam a essência, sonhamos com um dia em que possamos ver esse mundo uma só aldeia, pois só existe uma raça, a RAÇA HUMANA. Apesar desse sistema insano, onde tornou o homem um produto comercial, e ter conseguido capitalizar alguns dos nossos, acreditamos em um mundo melhor para todos, onde nossas diferenças possam ser respeitadas. Somos um POVO, que ainda acreditamos na necessidade de cuidarmos do planeta para as futuras gerações.

MM – O que o projeto Índios On-line está acrescentando, transformando, elaborando, desenvolvendo dentro e fora de sua comunidade?

YAkuy: Esse projeto caracteriza-se como uma janela e, quiçá uma porta para o mundo, estamos a margem da margem de uma sociedade hipócrita construída em torno do seu próprio umbigo. Índios On-line é uma luz que surgiu no centro da obscuridade em que nos encontramos. Para aqueles que não desejam nos enxergar não consigam mais fugir da realidade, em que nos colocaram.

Hoje vivemos uma expectativa de mudanças, o fato de podermos mostrar o que verdadeiramente somos e o que queremos, possibilitam-nos uma esperança de vida melhor.

MM – Gostaria de declarar algo sobre o assunto? De deixar uma reflexão para nossos leitores (temos 4 milhões de visitantes/mês no site)?

Yakuy: Historicamente, sempre fomos relegados a último plano, ou praticamente a nenhum plano de inserção contextual ao que verdadeiramente somos. Principalmente, nós ÍNDIOS DO NORDESTE, em especial os POVOS INDÍGENAS DA BAHIA. Sempre fomos usurpados, renegados, violentados, marginalizados, descaracterizados, por um processo histórico infame, vergonha da humanidade.

Atualmente, ouvimos muito falar em reparação, dívida histórica, etc.; não sabemos onde estamos inseridos nesse falatório com aspectos utópicos. Nosso direito originário a cada dia se distancia da verdade, da garantia de direito à VIDA com dignidade.

Precisamos da nossa emancipação econômica, e não apenas cultural ou étnica.

Nenhuma cultura vive isolada, fechada entre muros de uma fortaleza. Entretanto, congelaram nossa cultura, pertencemos ao passado – a negação da modernidade – tudo que não pertence ao Ocidente é do passado.

Precisamos, que sejam implantadas políticas públicas em nossas aldeias, que visem a nossa auto-sustentação, reconhecimento, e inserção no contexto atual. INCLUSÃO SOCIAL PARA OS POVOS INDÍGENAS!

O SER HUMANO não foi criado para viver isolado!