Nós índios, normalmente, temos uma vida de hábitos rurais, e na maioria das vezes nossas aldeias ficam distantes das cidades. Por isso, de modo geral, temos menos acesso à tecnologia eletrônica que as pessoas que vivem em cidades.
A primeira tecnologia desse tipo que chegou na minha aldeia Caramuru Paraguaçu foi o radio. Lá não tínhamos energia elétrica, e os aparelhos de rádio podem funcionar com pilhas. Por isso nosso primeiro contato com a tecnologia de informação foi com esse aparelho. Começamos então a ter um tipo de interação com a população circunvizinha, pois através dos programas que ouvíamos nas rádios, ficávamos sabendo das notícias, dos recados e das músicas que eram ouvidas pelas outras pessoas. Com o rádio dá para ouvir emissoras até de cidades mais distantes como Salto da Divisa.
Depois, algumas poucas pessoas conseguiram adquirir pequenos aparelhos de TV que podiam ser ligados à baterias. Eram aparelhos muito pequenos e em preto e branco. Como poucas pessoas tinham aparelho de televisão, muitas se reuniam em torno de um mesmo aparelho para poder ter acesso à informação que chegava. Não deixava de ser uma experiência interessante, pois muitas pessoas se reuniam todos os dias em uma mesma casa, para assistir a algum programa como uma novela ou um filme. Normalmente só dava para assistir um filme e uma novela, ou duas novelas por causa da bateria que não durava muito.
Depois com a chegada da energia passamos a comprar TVs maiores e coloridas. Também podiamos ficar assistindo por um tempo ilimitado. Apesar disso, essas tecnologias, a TV e o radio, ainda nos proporcionam pouco, pois com elas apenas temos a oportunidade de ver programas feitos para pessoas de fora das aldeias, já que as empresas de TV fazem muito mais programas com esse objetivo.
Com o tempo nos chegou o telefone, essa tecnologia permitiu a comunicação com parentes que estavam fora da aldeia, podíamos falar com outras pessoas sem ter que nos deslocar até elas. Isso já nos facilitou muito a vida, e em muitos casos nos deu a oportunidade de pedir ajuda médica em casos de urgência, e denunciar para jornalistas e para órgãos de apoio a causa indígena, situações difíceis que muito vivemos no passado e que ainda continuamos a viver.
Ganhamos uma radio comunitária, que além de servir para ouvir musica, nos ajuda a nos comunicar uns com os outros, já que temos pessoas morando em partes mais distantes na aldeia.
Ao longo de nossa história, muita coisa aconteceu e ainda acontece. Tínhamos necessidade de divulgar alguns fatos, mas não tínhamos nenhum meio de comunicação possível de ser usado, que nos permitisse passar para a sociedade nossas dificuldades.
A tecnologia que tínhamos a nossa disposição não permitia que nos comunicássemos para fora da aldeia, a não ser o telefone, que tem a limitação de só servir para falar com uma pessoa, normalmente não serve para divulgar as coisas para muitas pessoas de vez. Atualmente, chegou outra tecnologia que revolucionou a nossa relação com a comunicação. Essa tecnologia foi o computador e a internet, e com a chegada da internet essa situação mudou. Hoje podemos passar para o mundo todo nossas histórias, e ter a oportunidade dos não índios nos conhecer melhor, e nos respeitar como povos que tem culturas próprias. Antes, para poder levar nossas histórias para o mundo, precisávamos de jornalistas, antropólogos e outras pessoas de fora da aldeia, que levavam a informação que queriam passar, e não necessariamente a que estávamos querendo passar.
Algumas pessoas não índias tem um certo preconceito por nós índios estarmos usando a tecnologia, acham que este fato pode nós fazer perder nossa cultura. Isso, porém, não é verdade, a tecnologia pode nos trazer beneficio sem nos trazer mudanças ruins. Muito pelo contrário, a internet nós ajuda muito no resgate cultural, pois pela internet discutimos com outras tribos, e fazemos contatos que nos ajudam na nossa causa.
A principal importância da internet para nós índios é que, vamos ter contato com o mundo de qualquer forma, mas a internet permite que possamos escolher o que vamos querer absorver para nossas vidas, ao passo que a televisão e a rádio não nos dão opção. Ainda mais importante, na internet estamos criando um espaço indígena, e nele tomamos conhecimento uns dos outros. Já usamos vários serviços para isso, temos sites nossos, temos índios no Orkut com comunidades indígenas e isso nos ajuda até a combater os preconceitos que existem a nosso respeito. E, o que considero muito importante, nos nossos espaços somos nós que escrevemos. Assim passamos o que queremos passar, e temos a experiência de ter que comunicar nossas idéias de modo que todos entendam.

Olinda Muniz Wanderley