A REVOLTA É GRANDEguarani-venezia-94_screen

MAS A VONTADE DE LUTAR É MAIOR AINDA

 

Por Casé Angatu

 

Neste sábado (30/11/2013) estávamos na Aldeia Gwarini Taba Atã, Território Indígena Tupinambá, exibindo o filme “Terra Vermelha”. Todas as vezes que o nosso Cine Forum Tupy passa este filme a sensação de revolta entre os que assistem é grande. Porém, também é grande o desejo de fortalecimemos da luta por percebemos o quanto é justa.

 

O filme trata da história de uma retomada feita pelos Parentes Guarani-Kaiowá. Quem ainda não assistiu ao filme “Terra Vermelha” precisa vê-lo. É um filme forte porque, além de mostrar a justa luta dos Parentes Guarani-Kaiowá, denuncia como os ruralistas se apoderam da Terra Sagrada.

 

Entretanto, mais uma vez a tragédia anunciada saiu das telas do cinema e tornou-se realidade. “Terra Vermelha” entrou em cartaz, aproximadamente, a seis anos atrás (2008) e nada mudou para nossos Parentes. Aliás, mudou sim … mudou para pior. Uma prova disto foi que no último domingo (01/12/2013) outra liderança indígena foi morta: Ambrósio Vilhalva Kaiowá, um dos protagonistas principais do filme.

 

Ambrósio Kaiowá fez o papel do Cacique Nádio que, em “Terra Vermelha”, liderava seu Povo na ação de retomada de uma grande fazenda onde ficava sua Terra Sagrada e Ancestral – Tekoha.  Assim, como no filme Ambrósio era guerreiro na luta pelo direito ao Território Tradicional e por isto perseguido.

 

A polícia, parte da mídia e as elites brasileira, certamente, irão tentar diminuir esta morte – algo que já está acontecendo. Alegarão que o assassinado foi motivado pelo alcoolismo, desvio de comportamento, divergências entre os próprios índios, etc. No entanto, como escreve o Conselho Missionário Indigenista – CIMI, as razões são bem mais profundas:

 

“Expor grosseiramente os fatos relacionados à morte de Ambrósio apenas fragiliza a imagem dos indígenas e reforça os estereótipos que a hegemonia da elite agrária sul-mato-grossense insiste em vincular aos povos Guarani, com o intuito de reduzir as razões e a justeza que os levam a reivindicar seus territórios tradicionais. É preciso ser mais complexo e justo com a história, porque é exatamente o contrário disso.” Para ler na integra o texto do CIMI acessem:

http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&conteudo_id=7290&action=read

 

Neste texto o CIMI procura contextualizar histórica e antropologicamente como a morte de Ambrósio Kaiowá tem profundas relações com um processo de longa duração. Um processo histórico relativo à  forma como as elites brasileiras e seu estado roubaram as terras dos Guarani-Kaiowá, cometeram crimes (assassinados, torturas, prisões, imposições culturais) e confinaram aquele Povo em reservas. Um processo semelhante ao que aconteceu com os demais Povos Originários.

 

O alcoolismo, violência, depressão e suicídio presente entre os Guarani-Kaiowá e demais Povos Indígenas não são acontecimentos frutos do acaso. Da mesma maneira, a morte de Ambrósio Kaiowá não é fruto do acaso, da violência e do alcoolismo, como desejam demonstrar parte da mídia, as elites brasileiras e, provavelmente, as investigações policiais.

 

No sábado (30/11/2013) quando exibíamos o filme um dos Parentes Tupinambá comentou sobre a luta pela terra: “é esta nossa vida … é vida de Guerreiro … vida de Índio e só vamos sossegar quando tivemos nosso território de volta”.

 

A morte de Ambrósio Kaiowá não ficará no silêncio. Sabemos de quem é a culpa da Terra ficar mais uma vez Vermelha. É mais um Aba Gwarini Atã morto, mas muitos outros farão nossa luta frutificar. Mais um Guerreiro Indígena que não será enterrado e sim plantado para outros Guerreiros nascerem numa Terra com a cor de nossos sonhos.

 

Numa das cenas finais da película “Terra Vermelha” um jovem guerreiro, revoltado com a morte do Cacique Nádio  (Ambrósio Kaiowá), pinta seu rosto e grita sua revolta. Quando todos pensam que ele suicidará  … sua revolta flora com a energia de uma esperança plantada por nossos ancestrais … sempre foi assim a vida de Índio.

 

A demonstração que a morte de guerreiros como Ambrósio Kaiowá não são em vão foram as manifestações que ocorreram dias após o crime. No dia 04/12/2013 diferentes povos Indígenas, em Brasília, manifestaram-se contra as alterações na política de demarcação que o atual (des)governo tenta promover. A proposta do (des)governo e ruralistas é clara: alterar o modelo de demarcação para não ter mais demarcação.

 

O ministro da (In)Justiça (José Cardoso Alves), ministra da Casa (In)Civil (Gleisi Hoffmann) e Luis Inácio Adams, advogado Geral da (Des)União – AGU, pretendem passar o processo demarcatório para o ministério da (Des)Agricultura e do (in)Desenvolvimento Agrário (administrado pelos ruralistas da Confederação Nacional da Agricultura – CNA) e outros setores do governo. Para isto desejam sucatear ainda mais a já sucateada FUNAI.

 

Além disso, o (des)governo e ruralistas desejam também aprovar a PEC 215, consolidar a PLP 227 e a Portaria de 303, entre outras medidas. São medidas que assinalam para uma verdadeira declaração de Guerra do (des)governo contra os Povos Indígenas.

 

Enquanto isto o (des)governo e seus aliados suspendem todas as demarcações do Território Indígena, dizendo que serão revistas. Até mesmo os Territórios Indígenas demarcados sofrerão com esta revisão.

 

As manifestações do dia 04/12/2013 em Brasília demonstram que os Povos Originários não ficaram calados e sem ação. O caminho já vem ocorrendo: a autodemarcação. Mesmo que ruralistas, (des)governo e imprensa procurem criminalizar nosso Povo e suas justas ações.

 

Assim, como Cacique Nádio (Ambrósio Kaiowá) numa das cenas mais fortes do filme coloca a terra na boca e come, após ouvir as reclamações de um ruralista, demonstraremos para este (des)governo, sua (in)justiça e seus aliados ruralistas que somos a terra.

 

SOMOS A TERRA !

A TERRA SOMOS NÓS!

Awêrê Ambrósio Kaiowá!

Awêrê Todos Parentes na Luta pelo Território Sagrado!

“Oh, devolvam essas terras

Essas terras no pertencem

Nelas mataram e ensaguentaram

Os nossos Parentes”

Leiam também: “Informe de Aty Guasu sobre a morte da liderança Guarani e Kaiowa Ambrósio Vilhalva”:

http://racismoambiental.net.br/2013/12/informe-de-aty-guasu-sobre-a-morte-da-lideranca-guarani-e-kaiowa-ambrosio-vilhalva/